Final de semana e preguiça de pensar, ausência de palavras bonitas, de bons versos...
E se não são as palavras que importam, mas sim o sentimento, esse sim, vai carregado de bons desejos e de votos sinceros de muito sucesso, de coisas muito boas mesmo, e que todos os sonhos, até aqueles ainda não sonhados, vistam-se de realidade... seja feliz.
Geise, Feliz Aniversário !!!
E um abraço muitas vezes maior do que a mensagem acima!!!
Vivemos de amontoar palavras.
Ações, atos, atitudes, reações, respostas, retornos... desde o nascimento, balbuciando sons, sílabas, colando tudo, criando palavras, construindo frases... e não importa a cultura. Por mais simples que um ser humano possa ser, por menores que se apresentem suas capacidades literárias, construimos expressões e nos fazemos entender. Uma necessidade de expressão tão expressiva, que o aprendizado de uma única língua não pode suprir. Acostumamos com os sons, silvos e sibilos de palavras estranhas, fazemos bom uso de nosso cérebro elástico, o particionamos em um sem número de compartimentos, nos orgulhamos de nossa capacidade intelectual, e chamamos isso tudo de memória. Podemos então comunicar-nos com outros povos, nações, países, e assimilamos culturas, comportamentos, costumes. E recebemos informação, muita informação.
E enquanto me deixava cair, preguiçosamente, em frente à TV, ou ainda em antagonismo absoluto, correndo os olhos velozmente sobre as manchetes nos jornais da manhã, fiquei a imaginar a quantidade absurda de palavras que fazem parte de nossos dias, trafegando em ritmo absurdo em nosso cérebro, ocupando neurônios, desencadeando sinapses, movendo o mundo.
E da viagem das letras, veio-me a mente um dicionário, qualquer um... aquele pesado, que ocupa lugar de destaque na estante, ou mesmo leve, absolutamente virtual, não importa. É apenas um apanhado de verbetes, listados, exemplificados, vastamente explicados. Imaginei, em um exercício de insanidade, um dicionário, onde se pudessem encontrar, apenas palavras positivas, termos que não pudessem, em nenhuma hipótese receber qualquer significado negativo, pejorativo, mau. Que fossem apenas boas palavras, em essência, por origem. Quantos termos restariam, a preencher umas poucas páginas de um léxico acima de quaisquer suspeitas?
Naturalmente, uma utopia... alucinação, fantasia, ilusão, miragem apenas...
Atitudes... algo entre o gostar e o não gostar.
Pessoas, costumes, objetos, coisas... podem levantar nosso astral, ou causar o maior ataque de nervos... em muitos casos, talvez não causem sequer um bocejo de indiferença.
Obviamente, nossa reação é fruto da individualidade. Ou melhor, de nossa personalidade, aquela coisa que ninguém nunca viu, mas costumamos evocar como esconderijo, uma ótima saída para um comportamento fora de contexto, inaceitável. Por outro lado, o que deixa qualquer um maluco, pode esbarrar em um indivíduo que não perde a paciência por nada, nada mesmo. As diferenças...
O melhor de tudo, é que nosso próprio gosto é totalmente mutável - aquilo que nos deu prazer ontem pode aborrecer hoje, e o que agora não me incomoda, vai me tirar do sério no minuto seguinte. Pode ser influência do clima, da falta de sono, da companhia, de um monte de coisas... pode ser até falta do que fazer...
Na seqüência dos anos tudo muda também... deixa-se de entrar em algumas brigas, desistência mesmo, causa perdida... e arruma-se outras maiores, fruto da experiência.
Por isso tudo, pela total falta de importância destes detalhes, desisti de tentar explicar... ando correndo de algumas brigas, e não sirvo mais pra promotor... em casos de extrema necessidade, uma defesa tímida, desprovida de empenho... algumas coisas ainda conseguem me deixar de mau humor, de cara amarrada mesmo - nestes casos, "o silêncio é eloqüência"... e "boca fechada não entra mosca", mesmo...
Mas nestes dias de cobertura global, de sensacionalismo da mídia, impossível não pensar na quantidade de explosivos que poderia ser economizada se alguns indivíduos fechassem a boca uma vez que outra... e não entro no mérito dos resultados.
Mas a idéia que originou estas palavras mal alinhavadas, foi uma percepção, tímida a princípio, de que algo estava me incomodando neste espaço de letras... não, não eram minhas ausências constantes, tampouco a falta de assunto. E depois de pensar um pouco, acabei por imaginar que eram as bordas... sim, umas bordas brancas horrorosas que invadiam a tela em todos os sentidos, dividindo, separando, cortando ao meio esta virtualidade verde...
Arranquei as bordas... acabei com elas.
Agora sim... O que? Você não havia notado? E continua tudo do mesmo jeito? Ah, sim, não melhorou em nada... claro, minhas desculpas...
É o tal do gosto...
Estou pensando em trazer as bordas de volta...
... da teoria que carrego... já faz um bom tempo, e, sinceramente, não lembro, se fruto de um pensamento viajado, ou de outra mente pensante. Tento viver algo mais ou menos assim:
Se precisar arrepender-me de alguma coisa, que seja de algo que fiz, jamais do que tenha deixado de fazer. E exatamente nessa linha, aparece o pensamento de Luiz Fernando Veríssimo, bem coisa do tipo "aquilo que eu gostaria de saber escrever"...
"Versões de Mim" "Vivemos cercados pelas nossas alternativas, pelo que podíamos ter sido.
Ah, se apenas tivéssemos acertado aquele número (unzinho e eu ganhava a sena acumulada), topado aquele emprego, completado aquele curso, chegado antes, chegado depois, dito sim, dito não, ido para Londrina, casado com a Doralice, feito aquele teste...
Agora mesmo, neste bar imaginário em que estou bebendo para esquecer o que não fiz - aliás, o nome do bar é Imaginário -, sentou um cara do meu lado direito e se apresentou:
- Eu sou você, se tivesse feito aquele teste no Botafogo.
E ele tem mesmo a minha idade e a minha cara. E o mesmo desconsolo.
- Por que? Sua vida não foi melhor do que a minha?
- Durante um certo tempo, foi. Cheguei a titular. Cheguei à seleção.
Fiz um grande contrato. Levava uma grande vida. Até que um dia...
- Eu sei, eu sei... - disse alguém sentado ao lado dele.
Olhamos para o intrometido... Tinha a nossa idade e a nossa cara e não parecia mais feliz do que nós. Ele continuou:
- Você hesitou entre sair e não sair do gol. Não saiu, levou o único gol do jogo, caiu em desgraça, largou o futebol e foi ser um medíocre propagandista.
- Como é que você sabe?
- Eu sou você, se tivesse saído do gol. Não só peguei a bola como me mandei para o ataque com tanta perfeição que fizemos o gol da vitória.
Fui considerado o herói do jogo. No jogo seguinte, hesitei entre me atirar nos pés de um atacante e não me atirar. Como era um herói, me atirei... Levei um chute na cabeça. Não pude ser mais nada. Nem propagandista. Ganho uma miséria do INSS e só faço isto: bebo e me queixo da vida. Se não tivesse ido nos pés do atacante...
- Ele chutaria para fora.
Quem falou foi o outro sósia nosso, ao lado dele, que em seguida se apresentou:
- Eu sou você se não tivesse ido naquela bola. Não faria diferença. Não seria gol. Minha carreira continuou. Fiquei cada vez mais famoso, e com fama de sortudo também. Fui vendido para o futebol europeu, por uma fábula. O primeiro goleiro brasileiro a ir jogar na Europa. Embarquei com festa no Rio...
- E o que aconteceu? - perguntamos os três em uníssono.
- Lembra aquele avião da Varig que caiu na chegada em Paris?
- Você...
- Morri com 28 anos.
- Bem que tínhamos notado sua palidez.
- Pensando bem, foi melhor não fazer aquele teste no Botafogo...
- E ter levado o chute na cabeça...
- Foi melhor - continuei - ter ido fazer o concurso para o serviço público naquele dia. Ah, se eu tivesse passado...
- Você deve estar brincando! - disse alguém sentado a minha esquerda.
Tinha a minha cara, mas parecia mais velho e desanimado.
- Quem é você?
- Eu sou você, se tivesse entrado para o serviço público.
Vi que todas as banquetas do bar à esquerda dele estavam ocupadas por versões de mim no serviço público, uma mais desiludida do que a outra. As conseqüências de anos de decisões erradas, alianças fracassadas, pequenas traições, promoções negadas e frustração.
Olhei em volta. Eu lotava o bar. Todas as mesas estavam ocupadas por minhas alternativas e nenhuma parecia estar contente. Comentei com o barman que, no fim, quem estava com o melhor aspecto, ali, era eu mesmo. O barman fez que sim com a cabeça, tristemente. Só então notei que ele também tinha a minha cara, só com mais rugas.
- Quem é você? - perguntei.
- Eu sou você, se tivesse casado com a Doralice.
- E...?
Ele não respondeu. Só fez um sinal, com o dedão virado para baixo...
Creio que a vida não é feita das decisões que você não toma, ou das atitudes que você não teve, mas sim, daquilo que foi feito. Se bom ou não, penso, é melhor viver do futuro que do passado."